#088 23 anos depois a Xbox ainda está no coração dos jogadores
Uma história contada com a ajuda do Reddit.
Em 2001, na entrada no novo milénio, a indústria dos videojogos, estava a vibrar com tanta inovação e competição por um lugar no coração dos jogadores. A Sony, com a sua PlayStation 2, dominava o mercado, entretanto a Nintendo preparava a sua próxima consola doméstica, a GameCube, que prometia trazer uma nova e única experiência. Enquanto o mercado fervilhava, a casa de Redmond estreou-se no mercado dos videojogos, enquanto fabricante de consolas, com a sua consola doméstica: a Xbox. Anunciada em 2001, na CES (Consumer Electronics Show), a Microsoft mostrou a sua visão ambiciosa com hardware graficamente capaz e com funcionalidades inovadoras graças a, por exemplo, um disco rígido embutido (que não obrigava os jogadores a comprar cartões de memória) e uma ligação à internet através do Xbox LIVE. A consola, oficialmente lançada a 15 de Novembro de 2001, nos EUA, fez, a semana que passou, vinte e três anos.
No final de 2001, a expectativa pela chegada da Xbox à Europa era enorme. Com Halo: Combat Evolved como principal chamariz, a Microsoft prometia revolucionar o mundo dos videojogos. No entanto, apesar de acompanhar de perto o lançamento, não me recordo de um grande impacto da consola em Portugal. Na altura, a Sony dominava o mercado com a PlayStation 2 e a Nintendo, embora menos presente (pelo menos do que eu me lembro), já era uma marca consolidada. A SEGA, com a Dreamcast já descontinuada, deixou um vazio, mas a Microsoft não conseguiu preenchê-lo com a mesma pujança. Talvez a Sony e a Nintendo já estivessem demasiado enraizadas no imaginário dos jogadores, ou talvez a minha percepção tenha sido influenciada pela minha imaturidade no auge dos meus 17 anos e pelas óbvias limitações financeiras para adquirir jogos consolas e afins de um hobby tão caro de manter. Olhando para trás, é interessante notar como a chegada da Xbox marcou o início de uma nova era nos videojogos, com a Microsoft a tornar-se num dos principais players mais interessantes do mercado. No entanto, em Portugal, o impacto inicial parece ter sido mais contido.
Porém, o meu maior interesse nos videojogos, hoje em específico na Xbox, são da sua capacidade de criar memórias que nunca mais se esquecem - recordações que vivem sem pagar renda na nossa mente. Como tenho um profundo desconhecimento da marca que a Xbox original deixou nos jogadores portugueses, fui tentar procurar quem as tinha. Numa publicação que fiz no Reddit, onde assinalava o aniversário da consola, que soprava vinte e três velas, incentivei à partilha de memórias que tinham com a consola doméstica de Redmond, na tentativa de me pintarem uma imagem que eu não tinha. Curiosamente, naquela publicação, consegui obter mais de seis dezenas de comentários - nunca pensei que a adesão fosse tão grande.
Curiosamente, o cometário mais votado gerou uma interessante discussão com o tema: a popularidade da marca Xbox em Portugal. O utilizador u/ethicalhumanbeing dizia “Eu acho que em Portugal não deve haver muitas memórias. A Xbox nunca pegou cá, nem a original nem as seguintes, de uma forma geral”, o que diz muito sobre o domínio da Sony que ainda hoje perdura. A casa japonesa de produtos eletrónicos conseguiu convencer os consumidores quando entrou no mercado por gozar muito do estatuto de ter sido a empresa responsável por nos ter trazido excelentes televisões (as Bravia ainda hoje são muito boas para se ter na sala), leitores de música fantásticos e muito fiáveis (afinal foram eles que criaram o Walkman e tenho pena dos MiniDisc terem sido descontinuados) e aparelhagens com uma qualidade de som muito acima da média. Por sua vez, a Microsoft era conhecida pelo Windows, o sistema operativo mais utilizado do mundo - a Apple ainda não tinha conquistado o mercado dos computadores pessoais com os seus iMac coloridos. Mas a conversa não se centrou só na Xbox, houve comentários que se seguiram que questionavam qual é que era a mais impopular destas três: a Dreamcast, a GameCube ou a Xbox. Do que me recordo, a Dreamcast era a mais famosa entre os meus amigos, das três referidas a última consola da SEGA foi a que mais vi. Tive um primo que tinha uma GameCube com o seu melhor jogo: Super Smash Bros. Melee. Já a Xbox, só conheci uma pessoa com a consola muito mais tarde, quando estava a frequentar o Politécnico do Porto.
Espalhado por vários comentários curtos houve um tema que também foi levantado por bastantes utilizadores do Reddit: a pirataria. Do que se lembrou o comentador u/cyenz1904? “De apanhar o comboio para casa de um desconhecido de forma a "flashar" a bios (era um puto não havia dinheiro para jogos)”, dizia um dos mais de sessenta comentadores. Pessoalmente, as únicas consolas que sabia que davam para jogar videojogos gravados em CD ou DVD eram a primeira PlayStation, a PlayStation 2 e a Dreamcast. Também o fiz, não sou inocente e reconheço ser errado fazê-lo, pelas mesmas razões que todos invocaram - a falta de disponibilidade financeira. Por acaso, na altura já trabalhava a limpar automóveis, mas o dinheiro não chegava para tudo, um adolescente a caminho da fase adulta gasta dinheiro que se farta.
Um denominador comum em quase todos os utilizadores que responderam à minha publicação, que tiveam contacto com a consola de Redmond, foi terem jogado a obra-prima da Bungie, tal como contou u/theultimateattack: “Jogar Halo na casa do vizinho da minha avó e pensar que não era correto jogar um FPS com comando. Na altura nem sabia dizer FPS. Descarregar a rifle do Master Chief e ver a ammo restantes a descer e granadas que colam. Começou aí um gosto pelo Halo a que se juntou o Fable (...)”. O regresso momentâneo à idade pré-adulta é quase palpável, jogar fez quase sempre parte do crescimento da pessoa que recorda estes momentos. Tal como todos os jogadores da minha faixa etária, também tenho algumas histórias que posso contar e que já contei em outras edições da newsletter. Infelizmente, no caso da Xbox, não as posso contar na primeira pessoa.
A comentadora u/MariaVoldaren conta-nos a felicidade que era jogar depois de um dia de escola: “Ainda me lembro perfeitamente em 2001 o dia que a tive, o quão feliz estava e jogar Halo logo de seguida. Um dia para sempre! Estar ansiosa de chegar a casa depois da escola para jogar… jogar split screen e os convívios. (...) “, partilhou com um certo entusiasmo visível, porque jogar, hoje mais do que na viragem para o segundo milénio, também é partilhar experiências irrepetíveis, momentos que ficam tatuados na nossa memória; momentos que moldaram a nossa personalidade e tornaram aquilo que somos hoje.
Há quem conte histórias que nunca mais se vai esquecer, dadas as circunstâncias em que a vida nos coloca. O utilizador u/lpbms11 também contou a todos a sua experiência em que foi comprar a consola com o pai. “Fui com o meu pai à Worten e estava essa consola em promoção. Eu era um miúdo de prai 10/11 anos e nem sabia o que era, caiu do céu. Disse então ao meu pai se me podia oferecer aquela, ele disse que sim. Chegou ao pé da senhora e disse: olhe por favor, queria uma "xis oitenta xis". A senhora corrigiu, "uma xis box?" lol o meu pai deixou-me este ano e sem dúvida essa é uma das primeiras memórias que me vem à cabeça quando vejo esta consola (...)”.
Houve muitas outras histórias que nunca vou saber - por muito que a adesão à consola tivesse sido mínima, duvido que só sessenta pessoas a adquiriram -, porém são sempre de grande valor quando são partilhadas com quem já sentiu o mesmo na pele, com quem tem afinidade com videojogos. Excluí partilhas que me foram contadas em mensagens privadas e em outras redes sociais, não que tenham menos importância, mas quis cingir-me a esta rede social (se o Reddit for uma, nem tenho a certeza), porque, no fundo, juntou-se aqui um pequeno grupo de partilha pessoal. Claro, só comentei e partilhei o que é de mais positivo, não quis estar a preencher este artigo com negativismo (sim é isso que vende na internet), mas dada a audiência que esta newsletter atinge não vejo nenhuma necessidade de colar-me a opiniões mais efervescentes.
Tenho pena de nunca ter comprado uma Xbox original, só entrei no comboio na geração seguinte, com a Xbox 360 (ou a "PlayStation branca" como já ouvi numa loja). Tenho ainda mais pena da Microsoft ter perdido o foco depois da sua segunda máquina ter sido o sucesso que foi e quer ter estabelecido o seu domínio em várias áreas do entretenimento, praticamente ao mesmo tempo, com a Xbox One. Como muitos o fazem não recordei a consola num ano redondinho, acabado em zero ou cinco, assim não terá o mesmo impacto como quem o fez quando a Xbox fez duas décadas, tal como no podcast Piado do Pardal. Mas, como me disse o João Pardal, autor do podcast mencionado, “É sempre pertinente recordar efemérides”.
Leituras
Muita variedade de jogos que foram abordados na nossa praça. Escolham o jogo que mais vos interessa e leiam (é certamente por isso que cá estão).
De forma muito redutora, Back Then pode ser resumido como sendo um “walk simulator”, mas a narrativa faz superar qualquer rótulo. De que forma? Através dos diálogos dos familiares de Thomas e até dos próprios monólogos do personagem principal. É uma reflexão introspetiva sobre a condição humana e sobre a noção da passagem do tempo. - João Pardal sobre Back Then, Squared Potato
Tal como em referências do género, como Hades, morrer aqui é essencial, pois quanto mais morres, mais te tornas mestre das tuas habilidades. - Filipe Branco sobre Windblown, Café Mais Geek
Clock Tower é genuinamente assustador, muito graças ao estado de tensão em que coloca o jogador. Não só Scissorman pode aparecer a qualquer momento, o que se traduz numa corrida pela sobrevivência em busca de um esconderijo ou de uma arma para contra-atacar, como a mansão parece estar viva. - João Canelo sobre Clock Tower: Rewind, Echo Boomer
Depois de ter dedicado dezenas de horas a Hades, é curioso como é este magnífico jogo indie baseado em mitologia e lendas chinesas quem para mim melhor conseguiu captar a essência e o feedback do que muitos consideram ser a magnum opus não só da Supergiant Games, mas do género. - Ricardo Correia sobre Realm of Ink, Rubber Chicken
A equipa conseguiu meter todas as piadas e mais algumas na narração e nos diálogos entre as personagens. Aproveito desde já para sublinhar que a dobragem para português europeu está brilhante. É uma das melhores dobragens para a nossa língua que já vi e que transmite em pleno o espírito divertido de Horizon Adventures. - Jorge Loureiro sobre LEGO Horizon Adventures, Geekinout
Nisto, as Catedrais de Gloucester, Durham e todo o complexo universitário de Oxford inspiraram as linhas góticas e mágicas de Hogwarts Legacy, levando-nos a passear por corredores abobadados com arcos ogivais que se revelaram verdadeiras obras de engenharia e arte, e que ainda hoje nos assoberbam. - “Hogwarts Legacy | Uma jornada encantada pela arquitetura mágica do Castelo de Hogwarts” por Joana Sousa, Squared Potato
No início de cada capítulo é apresentado por um pequeno texto que visa Graham, caracterizando os traumas que o assombram no escuro. Vozes intermináveis que criam um arrepio na espinha cada vez que tenta abrir os olhos e escapar das garras destes lobos que o puxam. Esta atmosfera de aflição cria uma empatia crescente no jogador, culminando num desfecho sombrio que ecoa mesmo após a sua conclusão. - Pedro Almeida sobre The Night is Grey, Meus Jogos
Não deixará por isso de figurar como um “spin off” da série, abrindo caminho quiçá a um regresso às origens da série, talvez pela mesma Dotemu que em 2020 recuperou Streets of Rage com todo o sucesso. Quanto a Metal Slug Tactics o que me apraz dizer é que apesar da dificuldade um pouco acima da média (é um jogo que requer umas boas horas de aprendizagem e domínio até que possa ser tratado por “tu”) e de alguns percalços que podem tornar a experiência menos confortável, é um desafio amplo e seguro, repleto de opções e sistemas. - Vítor Alexandre sobre Metal Slug Tactics, Eurogamer Portugal
Convém até perder algum tempo com isto, tal como noutros jogos do género, caso contrário, arriscam-se a seguir apenas o caminho principal da história e a serem derrotados por qualquer um dos bosses. É óbvio que caí nesta armadilha, mas que atire a primeira pedra quem nunca se importou apenas e só pelo guião principal. - Élio Salsinha sobreRomancing SaGa 2: Revenge of the Seven, Salão de Jogos
Para quem vai começar agora, este Yakuza Kiwami é um remake lançado originalmente em 2017 que transforma o original numa experiência fantástica, aproximando-nos ainda mais da Kabukicho real, a inspiração para a Kamurocho virtual. Tudo aqui é mais imersivo, cinematográfico e hilário, porque só Yakuza consegue equilibrar com mestria o melodrama do submundo do crime japonês com a bizarria das missões secundárias. - André Pereira sobre Yakuza Kiwami (Nintendo Switch), Echo Boomer
Life is Strange: Double Exposure - É este o paradigma que configura a tentativa de escrever uma história mais complexa, que acaba por ser apenas confusa, muito por causa de uma aparente falta de interesse em pensar verdadeiramente o funcionamento da narrativa para além dos traços mais largos. - Henrique Adão sobre Life is Strange: Double Exposure, Meus Jogos
Para ouvir
Pessoalmente, tinha algumas saudades do Segazices, o podcast apresentado por dois enormes fãs da marca do ouriço azul. Felizmente, o Glitch Gamecast, nesta sua entrega de mais conteúdo para os seus ouvintes, criou o podcast “Sega Não Morreu”. Neste terceiro episódio, os apresentadores falam da Dreamcast, a consola que partiu cedo demais.
Vejam isto
Se há algo que gosto, dado que escrevo “O Albergue dos Silêncios” (prometo que está quase a voltar), é de descobrir novos jogos independentes. O Rui Parreira, uma das metades do Split-Chicken, foi ao seu canal mostrar Kusan: City of Wolves - um Hotline Miami com animais antropomórficos. O jogo parece uma boa escolha para colocar na minha lista de desejos do Steam.