#087 Perder uma vida é ganhar uma oportunidade
Um paralelismo entre videojogos e o quotidiano da vida.
No mundo dos videojogos, o conceito de “perder uma vida”, como nos clássicos Sonic the Hedgehog ou Super Mario World, é dos pilares mais antigos e fundamentais de game design e que os jogadores já estão bem familiarizados - até os mais recentes adeptos deste entretenimento. É um momento que pode ocorrer de várias formas, dependendo dos jogos que estivermos a ter em conta. Perde-se uma vida quando se cai num precipício em Super Mario World; se perdermos todos os nossos anéis e formos atingidos por um golpe de uma máquina de Dr. Robotnik especialmente concebida para aniquilar o ouriço azul em Sonic the Hedgehog; ou se falharmos um murro ou pontapé durante as lutas do beat'em'up Streets of Rage. A consequência destes infortúnios é perder uma de várias oportunidades para continuar a aventura, a punição ainda podia ser mais severa e obrigar-vos a recomeçar o nível desde o início, antes da fase em que chegam ao boss que vos irá atormentar. É nestas alturas, quando perdemos uma vida que o jogo nos oferece uma hipótese para recomeçar, aprender com os nossos erros e levantar-nos para continuar a progredir na jornada do nosso herói. Este sistema, aparentemente simples, espelha a experiência da vida humana, onde os contratempos são uma inevitabilidade da vida. Porém, é a nossa resiliência e o nosso crescimento que define a nossa jornada pelo jogo.
Em muitos jogos, normalmente os de plataformas, os jogadores têm um número finito de vidas associada à personagem que controlam. Cada vida representa uma nova oportunidade de explorar desafios, confrontar adversários que teimam em não sucumbir aos nossos ataques e, no fundo, progredir em direção ao grande objetivo do jogo. Quando um jogador perde uma vida pode ter sido por ter calculado mal o momento certo para efetuar um ataque ou um simples salto, ter tomado uma decisão arriscada, ou por nem sequer ter previsto que um inimigo ia assumir um comportamento mais agressivo com golpes mais fortes. É importante frisar isto: perder uma vida não é o fim; é uma chamada de atenção para o jogador refletir, adaptar-se e tentar uma nova abordagem. Os próprios jogos estão desenhados para recompensar a persistência e a capacidade de aprender com as adversidades. Enquanto jogadores, nós tentamos perceber o quê que correu mal, melhorar as nossas habilidades para superar-nos e repetirmos, novamente, o desafio. Isto tudo pelo ambicioso desejo de alcançar novos níveis ou aceder a novas experiências.
Como é que este conceito de game design - “perder vidas” - se relaciona com a vida real? A vida, tal como num videojogo, está repleta de dificuldades - não é fácil ser pai, ser um trabalhador alinhado com as ambições irreais do patrão, não é fácil ser responsável perante as exigências do quotidiano. Enfrentamos desafios pessoais e laborais, barreiras emocionais e momentos que não correm como nós queremos. Cada imprevisto é como perder uma vida num videojogo - uma derrota que nos pode deixar ficar frustrados, cansados e desanimados. Estes problemas da vida real podem surgir como uma entrevista de emprego que não correu bem, terminar uma relação amorosa na qual tanto investimos emocionalmente, fazer um erro crasso no trabalho que nos pode custar a nossa posição laboral, ou sentirem-se sobrecarregados pelas vossas responsabilidades. No entanto, tal como neste entretenimento que tanto dinheiro gera anualmente, imprevistos na vida real não determinam o nosso fim. São ocasiões próprias para parar, refletir e pôr em prática as lições que foram assimiladas. Se pensarmos nos problemas que enfrentamos na nossa vida como uma “vida perdida num videojogo”, pode fazer com estas sejam mais fáceis de gerir e ultrapassar. Quando se perde uma vida num jogo não é um falhanço completo; é experiência ganha, o que também se aplica aos desafios da vida real. Casa erro cometido permite-nos perceber o que é que podemos fazer de diferente para a próxima - quanto mais não seja, já estão mais preparados, têm que mais paciência ou até conseguem encarar as dificuldades com uma outra abordagem.
Tanto na vida como nos videojogos, há um conceito central em ambos, que está associado aos problemas encontrados: melhorar. À medida que os jogadores progridem num determinado jogo, tornam-se mais hábeis a utilizar as mecânicas que têm à sua disposição. Na vida real é similar. Imaginem uma criança que está a aprender a andar de bicicleta, vai cair muitas vezes, porém depois de se levantar percebe o erro que fez porque se não entender o que fez de errado vai voltar a sentir a mesma dor da próxima vez que cair. Assim, ao longo do tempo, a criança aprende a ficar mais equilibrada e com um maior controlo na bicicleta. Na idade adulta as consequências para os erros e imprevistos são mais graves, contudo a ideia permanece a mesma. Errar e ter problemas é inevitável, mas nunca podemos escolher não fazer nada perante estas situações e perder uma oportunidade de evoluir enquanto ser humano.
Tanto nos videojogos como na vida real, perder uma vida ou cometer um erro não é o fim do mundo, mas sim uma oportunidade de evolução de melhoraras nossas capacidades. Quando perdemos uma vida num jogo, sabemos que podemos aprender com o que correu mal, adaptar a nossa estratégia e, com resiliência, tentar de novo. Do mesmo modo, cada obstáculo que enfrentamos no dia a dia é uma oportunidade para refletir a situação que se opõe ao nosso progresso, redefinir os nossos objetivos e ambições e crescer para sermos melhores para nós próprios e para os outros. A capacidade de aprender com as falhas, seja para sairmos vitoriosos de uma campanha de um jogo ou na concretização dos nossos sonhos, torna-se uma das maiores lições que podemos aplicar em ambas as situações.
Os videojogos, portanto, ensinam-nos que persistir vale a pena. Estes moldam-nos para termos uma mentalidade de superação e paciência, onde cada nova tentativa nos aproxima mais do sucesso. Na vida, podemos adoptar essa mesma filosofia para enfrentar os nossos desafios pessoais. E tal como os personagens que controlamos nos jogos, cada “vida perdida” transforma-se numa experiência enriquecedora, dando-nos a força necessária para continuar em frente, independentemente das adversidades.
Por isso, ao olharmos para a nossa própria jornada pessoal, temos de ter a noção que não estamos apenas a viver, mas a jogar o jogo mais complexo de todos: a vida. E assim como em qualquer jogo, temos sempre a hipótese de melhorar, tentar de novo, e alcançar o próximo nível – cada vez mais preparados para o que está para vir.
Leituras
Estamos numa altura curiosa, onde regressam grande nomes dos videojogos (Mario & Luigi, Call of Duty, Sonic, Dragon Age e Silent Hill). Felizmente, na nossa praça há quem faça bom trabalho em criticá-los.
O progresso dentro da narrativa é acompanhado por uma indicação do nível adequado. Normalmente avancei um par de níveis acima do recomendado, o que não me preveniu de passar por alguns momentos delicados. Mas de um modo geral o grau de dificuldade não é dos maiores dentro da série. É um tipo de dificuldade satisfatório para não tornar a experiência nem demasiado frustrante nem demasiado acessível. - Vítor Alexandre sobre Mario & Luigi: Brothership, Eurogamer Portugal
Num meio onde a busca pelo fotorrealismo muitas vezes eclipsa a expressão artística, Slitterhead destaca-se como um triunfo de direção de arte. Letreiros vermelhos e azuis refletem-se em poças de água estagnada e as sombras dos becos são perfuradas por raios de luz. A cidade de Kowlong emerge como uma tela onde a tradição e modernidade colidem em explosões cromáticas deslumbrantes, criando um espetáculo visual que permanece gravado na memória. - Francisco Silva sobre Slitterhead, IGN Portugal
Nesta altura da minha vida jogar o multiplayer do Call of Duty é o mesmo que ter um ataque de “road rage” no meio da segunda circular em pleno pico de afluência de tráfego. No mínimo… testa os nossos limites como seres humanos. No entanto, isso não invalida a sensação de nostalgia que senti. - Gonçalo Martins sobre Call of Duty: Black Ops 6, Meus Jogos
Estes ecos ficam colecionados e disponíveis no vosso inventário que se resume a uma lista na horizontal, à qual terão de fazer scroll infinito caso queiram escolher um eco pouco utilizado. É certo que têm filtros, como listar por mais usados, recolhidos mais recentemente, etc, mas no final não existem categorias ou uma organização eficaz que me impeça de arrancar cabelos e dizer mal à minha vida sempre que tenho de andar à caça de um eco que sei que quero, sei que tenho, mas que está enfiado no meio de outros tantos. É a nódoa num pano que de outra forma é quase imaculado. - Carla Gonçalves sobre The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom, Portugal Gamers
Confesso que, apesar de ter vivido intensamente a “era nu-metal” na qual Shadow surgiu, sempre o achei um personagem um pouco exagerado e forçado – foleiro, até. Por isso, foi surpreendente vibrar com algumas sequências de ação e quick time events, com níveis visualmente espetaculares, quase como cenas de um filme do Dr. Strange. - David Fialho sobre Sonic X Shadow Generations, Echo Boomer
Continuam a ser cometidos certos vícios dos predecessores, como a inclusão de minijogos de pura sorte demasiado demorados e de minijogos redundantes com conceitos sobreponíveis a outros, mas só um me faz torcer o nariz: a existência de minijogos com controlos por movimento extremamente imprecisões. - Tiago Sá sobre Super Mario Party Jamboree, GameForces
A experiência de explorar a cidade de Silent Hill torna-se surreal e o contraste entre a missão de James e os espaços vazios, onde vemos sinais do tempo e de um passado impossível de categorizar, é fascinante devido à direção de arte e à combinação entre o cinzento do nevoeiro com os apontamentos de cor – e agora com a presença forte da chuva em alguns momentos da campanha. - João Canelo sobre Silent Hill 2, Echo Boomer
Para ouvir
The Games Tome é, provavelmente, o podcast mais antigo sobre videojogos. Só o voltei a acompanhar recentemente, porque não tenho tempo para muitos podcasts com episódios de três e quatro horas. Este episódio em concreto até é curto tendo em conta a média de duração dos episódios do The Game Tome. Este episódio é especialmente bom por revelar os hábitos de compra dos apresentadores e como têm feito para fazê-lo de uma forma melhor.
Vejam isto
Mais um excelente vídeo daquele que tem sido uma das minhas visitas obrigatórias sempre que abro o YouTube, o canal de Jacob Geller. É sobre sequelas, um tema muito interessante que, provavelmente, eu próprio abordarei aqui.